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Será o fim do Direito do Trabalho?

Neste dia 2 de maio, que passou a ser considerado pelo MGI (Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos) ponto facultativo, permitindo a emenda do feriado do dia 1º de Maio, gostaria de escrever sobre a evolução do direito do trabalho e as novas tecnologias; sobre a proposta da diminuição da jornada e o fim da escala 6×1; ou ainda, sobre o adiamento da vigência da NR-1, que postergou para 2026 a obrigatoriedade de medidas sobre saúde mental no trabalho.

Entretanto, o Direito do Trabalho corre o risco de desaparecer e assim como inúmeros doutrinadores, juristas, sociólogos, professores, jornalistas e operadores da área trabalhista, não posso me furtar a tratar do embate promovido pelo STF contra o Direito e a Justiça do Trabalho.

Não é de hoje o desprestígio da Justiça do Trabalho. Me lembro de ter ouvido, há mais de 30 anos, quando ainda era aluna do curso de Direito, que se o advogado não tivesse conhecimento e preparo, ainda lhe sobraria a área trabalhista, já que não seria tão complicado fazer um acordo na Justiça do Trabalho, muitas vezes chamada de “justicinha”, não só pelo número de conciliações, mas porque sempre defendeu o trabalhador, ou seja, o cidadão e a cidadã que acorda cedo, usa transporte público, trabalha muitas vezes sem intervalo e em sobrejornada, e ainda se vê obrigado(a) a procurar a Justiça para receber as verbas rescisórias devidas.

Recentemente, descobri que ter “emprego CLT” e “carteira assinada” virou sinônimo de ofensa entre crianças e adolescentes, pois significaria o mesmo que não ter sucesso.

De fato, passados mais de cem anos da instituição do dia 1º de Maio como feriado em comemoração ao Dia Internacional do Trabalhador, o futuro não me parece alvissareiro.

Ao contrário, os direitos de proteção dos trabalhadores, a tal “carteira assinada” e os direitos dela decorrentes, correm o risco de desaparecer.

Como se sabe, no mês passado, o Supremo Tribunal Federal, por meio de decisão monocrática do ministro Gilmar Mendes, reconheceu a repercussão geral do Tema 1.389 e suspendeu todos os processos que discutem a chamada “pejotização”.

Aliás, também não é de hoje que as decisões da Suprema Corte têm “confundido” os conceitos de terceirização e “pejotização”, de relação de emprego e relação de trabalho, forçando uma interpretação equivocada da Carta Constitucional e da CLT.

Para Marco Aurélio dos Anjos, a referida decisão “vai além de uma deliberação sobre competência ou técnica jurídica” pois “se traveste de legalidade para operar uma manobra política de contenção jurisdicional”.

E acrescenta, de forma clara e precisa, que “mais do que uma medida de efeito prático, trata-se de um gesto simbólico e disciplinador”, pois se a Justiça do Trabalho se recusa reiteradamente em aplicar os precedentes da Suprema Corte sobre terceirização e liberdade de organização produtiva, “resta-lhe o castigo da mordaça processual.”

Sobre o tema, Rosangela Rodrigues Lacerda e Silvia Teixeira do Vale, explicam com perfeição, que “o Supremo Tribunal Federal passou a decidir que as teses que liberaram a terceirização em atividade-fim igualmente liberaram o trabalhador para ser autônomo e poder decidir se desejaria ser empregado ou ‘pejotizado’.” Para as autoras, “é como se o trabalhador, pessoa física, prestadora de serviços em favor de outrem, de forma dependente, passasse, de uma hora para a outra, a ter plenos poderes de negociação, com total autonomia, podendo optar por ser celetista ou PJ.”

As críticas às decisões do Supremo em matéria trabalhista são muitas e fundamentadas. Afinal, não basta que o trabalhador esteja fantasiado de PJ para deixar de ser empregado; não se concebe a retirada da competência da Justiça Trabalhista de julgar as relações trabalho expressamente prevista no artigo 114 da CF; ou, de reconhecer a existência de vínculo empregatício, considerando nulos de pleno direito os atos que desvirtuam, impedem ou são capazes de fraudar a aplicação da lei, nos termos do artigo 9º da CLT.

Afinal, a legalização das fraudes pelo STF “é a maior ameaça que paira neste Dia dos Trabalhadores”, como garante o colunista do UOL, Leonardo Sakamoto.

Lorena Vasconcelos Porto faz uma comparação brilhante entre a Batalha de Dunquerque, de 1940, e o reconhecimento da repercussão geral do Tema 1.389 pelo STF, já que existe “a possibilidade de legitimação da fraude e de retirada da competência da Justiça do Trabalho com efeito vinculante”.

Assim como praticamente a totalidade da comunidade jurídico-trabalhista, na qual me incluo, Francisco Alberto da Mota Peixotto Giordani, se mostra indignado e decepcionado com o desacerto da decisão do ministro Gilmar Mendes. Afinal, os “prêmios” concedidos pelo STF aos trabalhadores neste Dia Internacional do Trabalhador, todos listados por Conrado Hübner Mendes, estão longe, mas muito longe mesmo, de promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, o emprego pleno e produtivo e, especialmente, o trabalho decente para todas e todos, conforme descrito no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 8 da Agenda 2030.

O feriado foi instituído pelo Decreto n. 4.859, de 26 de setembro de 1924, pelo então presidente Arthur Bernardes, determinando que, a partir de 1º de maio de 1925, o dia fosse “consagrado à confraternidade universal das classes operárias e em comemoração dos mártires do trabalho”.

  • Fabíola Marques é advogada, professora da PUC na graduação e pós-graduação e sócia do escritório Abud e Marques Sociedade de Advogadas.

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