Nesta sexta-feira, 7 de novembro, a escritora Ana Maria Gonçalves assume sua cadeira na Academia Brasileira de Letras (ABL), tornando-se a primeira mulher negra entre os atuais imortais e a sexta da história da instituição. Autora do aclamado Um Defeito de Cor, Ana leva à ABL não apenas sua obra monumental, mas também um projeto de transformação simbólica e cultural.
A cerimônia será marcada por inéditos históricos: o tradicional fardão foi confeccionado por profissionais da Portela, escola que homenageou sua obra no Carnaval de 2024. O traje, inspirado no modelo usado por Rachel de Queiroz em 1977, mantém os louros dourados e o verde clássico, mas carrega a força do samba, da ancestralidade e da moda popular.
Além disso, o evento contará com bufê de culinária africana, baile de música black e bateria de escola de samba — uma celebração da cultura negra em todos os sentidos. “Não quero mais falar só de representatividade. É hora de construir presença”, afirma Ana, que promete trabalhar pela popularização da ABL e pela valorização das múltiplas linguagens da língua portuguesa.
A escritora substitui o professor Evanildo Bechara e cita uma de suas frases como norte: “Precisamos ser poliglotas na própria língua”. Para ela, isso significa abrir espaço para as vozes das ruas, das periferias e das tradições afro-brasileiras dentro da Casa de Machado de Assis — outro imortal cuja identidade negra foi apagada nos registros oficiais.
Ana também propõe repensar os rituais da ABL, como o alto custo do fardão, e defende que escritores possam confeccionar seus trajes com costureiras de bairro ou barracões de escola de samba. “É um movimento político. É mostrar que há excelência fora dos circuitos elitizados.”
Um Defeito de Cor, romance que narra a trajetória de Kehinde, mulher africana escravizada no Brasil, é hoje considerado um dos livros mais importantes do século XXI. Com a homenagem da Portela, suas vendas quintuplicaram e alcançaram novos públicos. “A escola de samba fez mais pelo meu livro do que qualquer evento literário”, reconhece.
Agora, como imortal, Ana Maria Gonçalves se torna também guardiã de sua própria memória — e da memória de um Brasil que ainda precisa reconhecer sua negritude. “Quando eu morrer (porque a gente é imortal, não imorrível), volto para puxar o pé de quem me embranquecer.”
Fonte: Alma Preta
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