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O que esperar do Brasil na Conferência do Clima

Sem o presidente da República na edição da Conferência do Clima das Nações Unidas, a COP29, que começou na segunda-feira (11/11) em Baku, Azerbaijão, a delegação brasileira levou novas promessas. Parte do plano para cortar as emissões nacionais de gases estufa nos próximos dez anos foi anunciado dias antes, de surpresa.

A meta será apresentada formalmente pelo vice-presidente, Geraldo Alckmin, no documento oficial chamado de Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês). Ela estabelece que, em 2035, o país vai despejar na atmosfera entre 850 milhões e 1 bilhão de toneladas de gás carbônico, o que significa uma redução de 59% a 67% em comparação aos níveis de 2005.

Quem trabalha fora do governo com o tema das mudanças climáticas esperava mais da administração de Luiz Inácio Lula da Silva. Embora o país tenha sido o segundo a apresentar sua nova NDC, atrás dos Emirados Árabes, os números preocupam.

“Na prática, [a meta] mantém o país entre os poucos que ainda liberarão mais de 1 gigatonelada de CO2 por ano. O governo brasileiro ainda pode corrigir esse rumo antes de enviar oficialmente a meta à ONU”, disse, em entrevista à Deutsche Welle, Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa e especialista em política climática.

Márcio Astrini, diretor-executivo do Observatório do Clima (OC), rede com mais de 40 organizações da sociedade civil, concorda. “Se a meta é entre 850 milhões de CO2 e 1 bilhão, na prática, a primeira meta é 1 bilhão. Vai depender do que será apresentado no corpo da NDC durante a COP 29”, comenta.

Em 2023, as emissões brutas de gases de efeito estufa do Brasil foram de 2,3 bilhões de toneladas de gás carbônico equivalente (GtCO2e). O número representa uma redução de 12% em relação a 2022, quando o país emitiu 2,6 bilhões de toneladas, segundo dados do Sistema de Estimativa de Emissão de Gases, plataforma de monitoramento criada pelo OC.

Dinheiro

São muitos os países que chegam à COP29 marcados por catástrofes recentes devido a algum evento extremo climático. Das enchentes no Rio Grande do Sul passando pela seca na Amazônia, o Brasil está nesta lista, incluindo Espanha, Estados Unidos e nações africanas.

Em Baku, a discussão pende para quem vai pagar esta conta: serão necessários trilhões de dólares para prevenir e proteger as pessoas contra os impactos do aquecimento do planeta já previstos há décadas por cientistas.

Vencer o impasse histórico do financiamento, que coloca em pontas diferentes da mesa de negociação as nações desenvolvidas e as mais pobres, já seria um avanço, defende Fernando Sampaio, da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura. “A solução da crise climática depende de recursos, de uma resposta conjunta das nações”, comenta à DW.

Nesse sentido, o retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, segundo maior poluidor do planeta atrás só da China, tem tudo para bagunçar as conversas. O vencedor das eleições é um notório negacionista do clima e, durante seu primeiro mandato, negou-se a cumprir os compromissos de corte de emissões assumidos por Barack Obama, durante a assinatura do Acordo de Paris, em 2015.

Naquele ano, na COP21, na capital francesa, os países concordaram em estabelecer compromissos nacionais para evitar que o aumento médio da temperatura global ultrapasse 1,5 °C em relação à era pré-Revolução Industrial. Medições recentes apontam que 2024 tem tudo para se tornar o mais quente da história, com aumento médio do termômetro no limite.

“Ainda que não tenham cumprido as promessas anteriores de colocar dinheiro na mesa à altura da sua responsabilidade, os americanos têm relevância nos aportes aos fundos climáticos internacionais e serão peça-chave nas negociações. Com a eleição de Trump, está dado que os americanos vão se abster das suas responsabilidades históricas”, analisa Unterstell.

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E o fim dos combustíveis fósseis?

O Brasil chega a Baku com bons números na bagagem. Em 2024, a taxa de desmatamento na Amazônia caiu 30,6% em relação ao período anterior, que vai de agosto de 2022 a julho de 2023. No Cerrado, que desaparece numa velocidade maior, o ritmo de destruição também diminuiu. Foi uma redução de 25,8% em relação ao período anterior, a primeira em cinco anos no bioma.

“Os números são inquestionáveis”, diz Astrini. “Mas reduzir o desmatamento para quem quer ser líder e vai presidir uma COP não é suficiente. Para ser líder, é preciso incidir na agenda global, e não nos problemas domésticos. Incidir na agenda tem a ver com discutir os combustíveis fósseis e o financiamento. E não é o caso do Brasil”, critica.

Antes de chegar a Baku, a COP28, em Dubai, produziu um texto que colocou o ano de 2050 como limite para zerar as emissões líquidas geradas por combustíveis fósseis. O documento evitou falar explicitamente sobre “eliminação” de petróleo, gás e carvão, e disse que uma transição deve ser acelerada nesta década.

“Cabe à COP de Baku avançar, ou ao menos não permitir retrocessos na menção do documento final da COP 28, que citou pela primeira vez a necessidade de que os países reduzam o uso de combustíveis fósseis”, afirma Sampaio.

Ainda não se sabe como o Brasil vai lidar com este tema. Em casa, o país pode inaugurar em breve uma nova frente de exploração de petróleo, na bacia marítima da Foz do Amazonas, ou Margem Equatorial. A Petrobrás busca licença há uma década para perfurar poços na região, mas nunca teve o pedido autorizado. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), apesar de ter um parecer interno assinado por analistas que recomendam o arquivamento do pedido, deu mais uma chance para a petroleira detalhar seus planos e tentar mais uma vez.

Belém

Com uma boa reputação junto a delegações do mundo inteiro, a diplomacia brasileira deve adotar uma postura colaborativa em Baku. É desejado que o máximo de “nós” possíveis sejam desatados para que não se acumulem para a próxima COP, marcada para acontecer em Belém no próximo ano.

Até 2025, todos os 196 países que assinaram o Acordo de Paris precisam renovar seus compromissos climáticos nacionais, ou NDCs. A soma de todos eles teria que ser suficiente para limitar o aumento da temperatura a 1,5 °C. Com o que se tem até agora, o mundo ruma para um aquecimento de 2,5°C a 2,9°C até o fim do século, segundo a ferramenta que monitora as NDCs criada pelo World Resource Institute.

Para que a transição de Baku para Belém seja suave, a atual rodada teria que pressionar os países a assumirem metas mais ambiciosas em suas NDCs, criar um novo modelo de financiamento climático e garantir dinheiro público – e trilionário – aos mais vulneráveis, sugerem fontes ouvidas pela DW.

E a raiz da crise climática jamais deve ser colocada de lado: a queima desenfreada de petróleo nos últimos 200 anos que levou ao acúmulo sem precedentes de gases de efeito estufa da atmosfera. É este o grande vilão causador das mudanças climáticas, como ressalta o consenso científico.

“Não se pode esquecer: é crucial avançar em um roteiro claro para a transição para longe dos combustíveis fósseis”, diz Natalie Unterstell sobre a COP 29.

Fonte:  Deutsche Welle, por Nádia Pontes.

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