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A primeira mulher a presidir uma central sindical nacional

  • Texto publicado originalmente pelo site Vermelho, por Davi Molinari

Filiada ao PCdoB, líder potiguar assume o comando da Nova Central Sindical dos Trabalhadores e das Trabalhadoras e resgata o pioneirismo das mulheres do Rio Grande do Norte.

O movimento sindical brasileiro escreve hoje um novo capítulo em sua história. Filiada ao PCdoB, Sônia Maria Zerino da Silva toma posse nesta terça-feira (2) na presidência da Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST), tornando-se a primeira mulher a assumir o comando máximo de uma entidade nacional entre as centrais sindicais registradas no Brasil.

A ascensão de Sônia, bacharel em Administração de Empresas, com atuação também na Federação dos Trabalhadores nas Indústrias do Rio Grande do Norte e na Confederação de Mulheres do Brasil, não é apenas um triunfo pessoal, mas simboliza a ruptura de um ambiente historicamente dominado pelos homens.

Em entrevista ao Portal Vermelho, antes mesmo de detalhar suas metas para a gestão, a nova presidenta fez questão de ilustrar como o machismo se materializa na própria arquitetura do poder. Ela recordou que o plenário do Senado Federal, inaugurado em 1960, só passou a ter um banheiro feminino em 2016. Durante 55 anos, as senadoras precisavam se deslocar ao restaurante anexo para atender às necessidades básicas.

“A obra adaptou um banheiro masculino já existente para criar um espaço exclusivo às senadoras, que até então precisavam sair do plenário, mesmo quando já ocupavam 15% das cadeiras”, lembrou Sônia. O relato denuncia como as instituições foram projetadas exclusivamente para homens, uma realidade que ela agora desafia ao assumir a presidência da NCST.

Herdeira do pioneirismo potiguar

A chegada de uma potiguar ao topo de uma central nacional liga o presente a uma longa tradição de vanguarda feminina no Rio Grande do Norte. Sônia pode ser considerada herdeira política de uma tradição que inclui Celina Guimarães Viana, a primeira eleitora do Brasil (1927), e Alzira Soriano, a primeira prefeita eleita da América Latina (1928, em Lajes-RN).

A lista de pioneiras inclui ainda Júlia Alves Barbosa, primeira vereadora de Natal, e Maria do Céu Fernandes, primeira deputada estadual do país. O estado também se destaca por ter eleito diversas governadoras, como Wilma de Faria, Rosalba Ciarlini e a atual governadora Fátima Bezerra.

Apesar desse histórico, Sônia alerta que a representatividade ainda enfrenta barreiras: em 2022, a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte contava com apenas três mulheres em 24 cadeiras. Na legislatura atual, são cinco mulheres. “O pioneirismo de uma mulher potiguar à frente da Nova Central não é um fato isolado, mas parte de um destacado protagonismo de mulheres que conquistaram espaços na política antes reservados apenas aos homens”, pontua a dirigente.

O desafio do pleno emprego e a precarização

A posse de Sônia ocorre em um momento excepcional para a economia e o mundo do trabalho. O Brasil vive um cenário próximo ao pleno emprego, com a taxa de desocupação atingindo mínimos históricos entre 5,4% e 5,6%. Contudo, a nova presidenta da NCST adota uma postura analítica e cautelosa.

Para a central, a manutenção dessa tendência enfrenta obstáculos estruturais: a alta taxa de informalidade, que deixa trabalhadores sem proteção social; a necessidade urgente de qualificação profissional; e as pressões inflacionárias em um ambiente de juros elevados.

A NCST enxerga no governo Lula um aliado fundamental para o diálogo e a justiça social, mas mantém autonomia e postura vigilante. A entidade cobra ações efetivas para reverter os danos da reforma trabalhista de 2017, que enfraqueceu financeiramente os sindicatos e precarizou direitos.

Para Sônia, o caminho para o fortalecimento sindical passa pela “reorganização interna, mobilização das bases para além do local de trabalho e uso de novas tecnologias”, com foco especial na juventude e na reindustrialização do país. A dirigente defende que o desenvolvimento industrial não pode ser apenas econômico, mas deve ser “socialmente justo, sustentável e colocar os trabalhadores no centro do planejamento”.

Leia sua entrevista ao Portal Vermelho:

Vermelho: Como você avalia o cenário atual do mercado de trabalho no Brasil, com o pleno emprego em alta, e quais os desafios para manter essa tendência?

Sônia Zerino: O Brasil apresenta indicadores positivos que sugerem uma condição próxima ao pleno emprego, com taxa de desocupação atingindo mínimos históricos, cerca de 5,4% a 5,6% nos últimos meses. Apesar dos avanços, temos desafios para manter essa tendência: alta taxa de informalidade — embora esteja em queda, ainda temos trabalhadores que atuam sem proteção social e com rendimentos baixos —, qualificação profissional, disparidades regionais e demográficas, além do ambiente macroeconômico e das pressões inflacionárias. A manutenção do pleno emprego em um ambiente de juros elevados pode ser desafiadora, exigindo políticas públicas econômicas cuidadosas.

Vermelho: Qual a perspectiva da NCST diante das políticas do governo Lula para avançar nos direitos dos trabalhadores e ampliar a justiça social?

Sônia Zerino: A NCST vê o governo Lula como um aliado potencial e um ambiente mais favorável para o diálogo e a defesa da justiça social, reconhecendo avanços significativos. No entanto, mantém uma postura vigilante e reivindicativa, cobrando ações mais efetivas e enfrentando os desafios impostos pelo cenário político-institucional.

Vermelho: Depois da reforma trabalhista de 2017, que enfraqueceu sindicatos e precarizou muitos direitos, quais são as estratégias para recuperar a força do movimento sindical?

Sônia Zerino: Para recuperar a força do movimento sindical após a reforma trabalhista de 2017, as principais estratégias envolvem, entre outras, a reorganização interna, a mobilização da base para além do local de trabalho, o uso de novas tecnologias de comunicação e a busca por novas formas de financiamento e representação.

Vermelho: O Brasil precisa retomar um plano nacional de desenvolvimento industrial. Qual o papel dos sindicatos e da NCST nesse processo?

Sônia Zerino: A NCST e suas entidades filiadas são atores sociais e políticos que buscam garantir que o desenvolvimento industrial não seja apenas econômico, mas também socialmente justo e sustentável, colocando os trabalhadores no centro do processo de planejamento e execução da política industrial.

Vermelho: Como a NCST está atuando para envolver as novas gerações de trabalhadores e ampliar a participação sindical?

Sônia Zerino: A NCST vem adotando várias iniciativas recentes para aproximar as novas gerações, reconhecendo que a juventude é fundamental para a renovação do movimento. O sindicalismo precisa se abrir para a escuta ativa da juventude e agir com coragem para mudar o que afasta essa geração. Em 2025, organizamos junto à CNTI o 1º Encontro Online da Juventude Industriária, voltado para fortalecer o protagonismo jovem. A central tem articulado cursos e espaços de formação para garantir que pautas específicas, como a precarização na economia de plataformas, sejam debatidas e incorporadas à agenda sindical.

Vermelho: A presença feminina na liderança sindical tem crescido — como você vê esse avanço como parte das transformações maiores?

Sônia Zerino: A presença feminina na liderança sindical é um sinal claro de que as estruturas tradicionais estão se redefinindo. É um avanço positivo que fortalece o movimento sindical como um todo e é essencial para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.

Vermelho: Quais as ações da NCST para promover a diversidade e a inclusão nos sindicatos e nas negociações com o governo?

Sônia Zerino: A Nova Central promove a diversidade e a inclusão por meio da participação em cursos e debates sobre igualdade de gênero, apoio às políticas de inclusão do governo e defesa da valorização da diversidade cultural brasileira.

Vermelho: Para finalizar, qual mensagem você deixa para os trabalhadores e trabalhadoras que esperam uma sindicalização mais forte e representativa no Brasil?

Sônia Zerino: A todos os trabalhadores e trabalhadoras que sonham com uma sindicalização mais forte e verdadeiramente representativa no Brasil: não desistam da construção coletiva. A força de qualquer sindicato nasce da participação de cada pessoa, das vozes que se somam, das mãos que se estendem, das ideias que se colocam à mesa. Fortalecer a organização sindical não é apenas um ato de reivindicação; é um ato de cidadania, coragem e solidariedade. Em um país diverso e complexo como o nosso, a transformação acontece quando trabalhadores e trabalhadoras reconhecem seu poder, unem suas pautas e defendem, em conjunto, condições dignas, respeito e justiça.

Fontes: Site Vermelho, Central Sindical, Luta das Mulheres, NCST, Sindicalismo e Trabalho, por Davi Molinari

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