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Sindicatos fragilizados e o impacto ao trabalhador

A recente discussão e a tendência crescente de facilitar o cancelamento da contribuição sindical, migrando de um processo presencial para plataformas online, aplicativos ou e-mail, não é um mero avanço tecnológico ou uma simples medida de desburocratização. É, na verdade, o capítulo mais recente de um projeto político e econômico que visa enfraquecer a organização coletiva dos trabalhadores para fortalecer o poder de negociação do patronato.

Como anda o processo

A tendência é inequívoca: a flexibilização total do cancelamento. Após a reforma trabalhista de 2017, que tornou a contribuição sindical facultativa, o próximo passo lógico para os detratores do sistema sindical é remover qualquer barreira, por menor que seja, para o não pagamento. A exigência do cancelamento presencial, embora vista por alguns como um obstáculo, era a última trincheira que garantia ao sindicato a oportunidade de dialogar com o trabalhador, de apresentar os benefícios da sindicalização e de contra-argumentar a narrativa de que o sindicato é apenas um custo.

Decisões judiciais pontuais e projetos de lei no Congresso Nacional têm consistentemente apoiado a ideia de que o cancelamento pode ser feito por qualquer meio digital. A tendência é que isso se consolide como a norma, seja por nova legislação ou por jurisprudência firmada.

Desmobilizar e dominar

O fundamento apresentado publicamente é o da “liberdade individual” do trabalhador. Argumenta-se que ninguém deve ser obrigado a se deslocar para cancelar um serviço que não deseja. Parece razoável, mas é uma lógica superficial que mascara a real intenção.

O verdadeiro fundamento é o esvaziamento financeiro e político dos sindicatos. Um sindicato sem recursos é um sindicato sem capacidade de ação. Ele não consegue manter uma estrutura mínima, contratar advogados para ações coletivas, realizar fiscalizações, promover campanhas de conscientização ou, crucialmente, organizar uma greve com o suporte necessário aos trabalhadores. A ideia é transformar o sindicato em uma figura decorativa, incapaz de representar uma ameaça real aos interesses do capital.

Custo ao trabalhador

No Bolso: O valor da contribuição (geralmente um dia de trabalho por ano na assistencial, ou uma pequena mensalidade para associados) é apresentado como o grande vilão do salário do trabalhador. De fato, para orçamentos apertados, qualquer valor faz diferença. No entanto, essa economia imediata é uma “miopia financeira”.

Nos Direitos: O que o trabalhador perde ao deixar de contribuir é imensuravelmente maior. Sem a força do sindicato, direitos básicos negociados em Convenções e Acordos Coletivos de Trabalho ficam ameaçados. Estamos falando de:

  • Pisos salariais acima do mínimo nacional.
  • Reajustes anuais acima da inflação.
  • Benefícios como vale-alimentação, vale-refeição, plano de saúde, auxílio-creche, participação nos lucros e resultados (PLR).
  • Regras sobre horas extras, banco de horas e condições de trabalho mais favoráveis que a CLT.
  • Segurança jurídica e assistência em casos de demissão em massa, assédio moral ou acidentes de trabalho.

Esses benefícios, conquistados coletivamente, valem muito mais do que o valor da contribuição. O trabalhador economiza R$ 200 por ano, mas perde a garantia de um reajuste salarial que pode representar R$ 1.200 ou mais no mesmo período, além de todos os outros benefícios. É a troca do ouro pelo troco.

Políticos empresários

O interesse do setor patronal é óbvio: negociar individualmente. Um empregador negociando com um único trabalhador está em posição de poder absoluto. Ele impõe as condições. Um empregador negociando com um sindicato forte, que representa milhares de trabalhadores, encontra um contrapeso. A negociação se torna mais equilibrada.

No Congresso Nacional, a bancada empresarial e políticos alinhados a essa visão atuam para aprovar leis que individualizam as relações de trabalho. O discurso é sempre o da “modernização” e da “liberdade”, mas o resultado prático é a precarização. Ao minar a fonte de custeio dos sindicatos, eles garantem que não haverá resistência organizada e eficaz contra pautas como a redução de direitos, a terceirização irrestrita e a “pejotização”.

Sustentação Sindical

Se o trabalhador for convencido pela narrativa de que o sindicato é inútil e caro, a sustentação sindical entrará em colapso. O futuro dos sindicatos dependerá de uma mudança radical de estratégia:

Comunicação Agressiva: Os sindicatos precisarão investir pesado em comunicação direta e transparente, mostrando de forma clara e objetiva, com números, o quanto cada benefício da convenção coletiva representa no bolso do trabalhador. O trabalhador paga um valor pequeno (os R$ 20,00 do exemplo) para o sindicato. Com esse dinheiro, o sindicato se fortalece e consegue negociar com os patrões. Nessa negociação, ele conquista benefícios que valem muito mais do que a contribuição, como o vale-alimentação de R$ 300,00 e o aumento de 5% no salário.

Ou seja: a contribuição sindical não é um gasto, mas sim um investimento que traz um retorno financeiro muito maior para o trabalhador. Sem esse “investimento”, o sindicato não teria força para garantir esses direitos e benefícios.

Presença Relevante: O sindicato não pode ser apenas uma entidade que aparece na época da negociação salarial. Precisa estar presente no dia a dia, oferecendo serviços relevantes, canais de denúncia eficazes e apoio real.

Representatividade Genuína: A base trabalhadora precisa se ver na diretoria do sindicato. A renovação e a democracia interna são fundamentais para que o trabalhador sinta que aquela entidade, de fato, luta por ele.

Em resumo, a facilitação do cancelamento da contribuição sindical é uma ferramenta estratégica para desarmar o trabalhador na arena da negociação capital-trabalho. A economia gerada para o indivíduo é irrisória perto do poder de barganha e dos direitos concretos que são perdidos coletivamente. Convencer o trabalhador disso é o maior e mais urgente desafio do movimento sindical brasileiro hoje.

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