O IBGE divulga pela primeira vez, como estatística experimental, a Evolução dos Indicadores não Monetários de Pobreza e Qualidade de Vida no Brasil com Base na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF). Esse trabalho acompanha a evolução da pobreza e da vulnerabilidade no Brasil, a partir de uma abordagem multidimensional e não monetária, baseado nas duas últimas edições da POF (2008-2009 e 2017-2018).
Três índices são apresentados: Índice de Pobreza Multidimensional não Monetário (IPM-NM), Índice de Vulnerabilidade Multidimensional não Monetário (IVM-NM) e Índice de Pobreza Multidimensional não Monetário com Componente Relativo (IPM-CR).
“A POF investiga diferentes aspectos da vida das famílias: o aspecto monetário, a aquisição de bens e serviços e a qualidade de vida”, explica Leonardo Oliveira, gerente da pesquisa. “A disponibilidade de dados da POF possibilita um olhar complementar aos indicadores tradicionais de pobreza baseados apenas na renda e no consumo. A riqueza de informação da POF viabiliza o acompanhamento de índices não monetários sobre a qualidade de vida e a pobreza que podem seguir trajetórias distintas dos indicadores tradicionais, pois consideram aspectos da saúde, educação, meio ambiente etc.” explica.
O estudo identificou o universo de pessoas com algum grau de pobreza ou de vulnerabilidade, sob a ótica multidimensional, avaliando cerca de 50 indicadores não monetários, divididos em seis dimensões: moradia, acesso aos serviços de utilidade pública, saúde e alimentação, educação; acesso aos serviços financeiros e padrão de vida, e transporte e lazer.
As pessoas são consideradas em situação de pobreza quando a pesquisa detecta perdas e privações de qualidade de vida equivalentes a pelo menos duas dimensões inteiras. Dessa forma, sabemos que 22,3% da população brasileira tinha algum grau de pobreza multidimensional em 2017-2018, e que houve uma queda de 21,9 pontos percentuais (p.p.) em relação ao percentual (44,2%) encontrado pela POF 2008-2009.
Já a situação de vulnerabilidade existe quando são detectadas perdas equivalentes a, pelo menos, o tamanho de uma dimensão inteira, ou seja, metade da exigência para a classificação na situação de pobreza multidimensional. Em 2017-2018, cerca de 63,8% viviam com algum grau de vulnerabilidade multidimensional, uma proporção menor que os 81,7% encontrados em 2008-2009.
IPM-NM tem redução de 65%, mas desigualdade entre os grupos de cor ou raça aumenta
Os distintos graus de pobreza observados foram incorporados ao cálculo do IPM-NM que caiu de 6,7 em 2008-2009 para 2,3 em 2017-2018, uma variação de 65%. Para o analista, esse recuo revela que, de fato, houve uma queda mais intensa da pobreza. O estudo também mostrou quedas nos recortes urbano (de 4,8 para 1,6) e rural (de 15,7 para 6,4). “A pobreza permaneceu maior na área rural, indicando que a desigualdade na qualidade de vida permanece entre estas duas áreas”, afirma Leonardo.
Houve redução do IPM-NM em todas as regiões, com destaque para o Sul, que tinha o menor índice em 2008-2009 (2,2) e apresentou a maior redução percentual em 2017-2018 (caiu para 0,6). Já as regiões Norte e Nordeste permanecem com os maiores IPM-NM, com o primeiro saindo de 13,8 para 5,2 e o segundo, de 12,4 para 4,3. Nas duas edições da POF, o Nordeste contribuiu com mais da metade das perdas de qualidade de vida no país.
Houve redução do IPM-NM tanto para as famílias cuja pessoa de referência era da cor branca quanto para aquelas onde a pessoa de referência era da cor preta ou parda. No entanto, a redução da participação no valor do índice ocorreu apenas para as famílias cuja pessoa de referência era branca: saiu de 22,9% para 19,7% no período analisado. Ou seja, a participação das famílias cuja pessoa de referência era preta e parda no índice de pobreza multidimensional do país subiu de 75,7% em 2008-2009 para 79,1% em 2017-2018. “Cabe destacar que esse dado também reflete o maior número de pessoas se declarando preta ou parda”, afirma o analista.
Os resultados também mostram queda acentuada do índice em todos os subgrupos de níveis de instrução das pessoas de referência das famílias. A participações no valor do índice para a parcela da população que vivia em famílias cuja pessoa de referência era sem instrução reduziu (23% para 21,2%), bem como da população cuja família tinha pessoa de referência com ensino fundamental incompleto (60,7% para 55,7%). “Ou seja, a concentração da pobreza ainda permanece elevada nesses dois níveis de instrução que respondem por mais de 75% do índice”, verifica Leonardo.
O IPM-NM segue maior nas famílias com a presença de crianças (7,9 com mais de um adulto e 7,1 para um adulto). Porém, a contribuição percentual para a composição do valor do índice, para o subgrupo das famílias com mais de um adulto e ao menos uma criança, diminuiu, saindo de 63,3% para 55,3%. Do outro lado, cresceu a participação das famílias com mais de um adulto e sem crianças, de 16 % em 2008-2009 para 21,2% em 2017-2018.
Considerando-se os décimos de renda disponível familiar per capita, houve queda em todos. “Mas os índices nos décimos mais baixos continuam bem acima do valor visto para o último décimo”, explica o analista. Com isso, o grupo com as quatro faixas de menores rendimentos aumentou a participação no total do índice, chegando a 79,4%.
Na análise por subgrupo definido por sexo da pessoa de referência da família, o IPM-NM não mostrou diferença significativa para distância entre os índices em 2008-2009. Entretanto a queda do índice foi maior nos casos em que a pessoa de referência era homem (indo de 6,6 para 2,1) do que nos casos em que a pessoa de referência era mulher (indo 6,8 para 2,7).
De 2008-2009 para 2017-2018, os índices das Unidades da Federação melhoraram, embora de forma desigual. No período, nenhum estado do Norte ou do Nordeste teve IPM-NM abaixo da média nacional. O menor índice foi o de Santa Catarina (que foi de 2,0 para 0,3) e o maior foi do Maranhão (que foi de 18,7 para 7,7). O Ceará teve o menor índice (3,0) do Nordeste e o Rio de Janeiro, o maior (2,1) do Sudeste em 2017-2018.
IVM-NM tem queda de 47% entre 2008-2009 e 2017-2018
Índice de Vulnerabilidade Multidimensional Não Monetário (IVM-NM) no Brasil caiu de 14,5 em 2008-2009 para 7,7 em 2017-2018, um recuo de 47%. A diminuição deste índice, portanto, foi menor que a observada no IPM-NM. O comportamento, porém, foi o mesmo observado no índice anterior: com a contribuição da área urbana (69,8%) sendo mais que o dobro da área rural (30,2%).
Entre as regiões, também queda difundida, com Norte e Nordeste apresentando os maiores valores, com a primeira saindo de 24,0 para 13,7 (queda de 43%) e a segunda saindo de 22,3 para 12,2 (-45,5%). Do outro lado, o Sul tinha IVM-NM de 8,2 e reduziu para 3,9, caindo 53,1% no período.
IPM-CR teve queda de 20% no período entre as pesquisas
O Índice de Pobreza Multidimensional Não Monetário com Componente Relativo (IPM-CR), ao contrário dos outros dois índices, não adota pontos de corte, nem classifica as pessoas como pobres e não pobres. “Esse índice utiliza uma função de pertencimento, estabelecida com base nas informações sobre as perdas individuais de qualidade de vida”, explica o analista. Essa função de pertencimento associa a cada pessoa da população um grau ou componente relativo. Juntos, o componente relativo e o nível de perdas de qualidade de vida de cada pessoa determinam os graus de pobreza na população, assim como o valor do índice.
O IPM-CR do Brasil também recuou, sendo a redução de 20% no período analisado: de 15,0 em 2008-2009 para 12,0 em 2017-2018. O índice recuou tanto para a área urbana quanto na rural, com reduções parecidas, em torno de 19%, seguindo a maior intensidade da pobreza na área rural em relação à urbana.
Em nenhum estado do Norte ou do Nordeste o IPM-CR ficou abaixo da média do Brasil. Segundo o índice houve redução da pobreza em todas as unidades da federação No Maranhão, o IPM-CR caiu de 27,6 em 2008-2009 para 22,0 (redução de 20,3%). Em Santa Catarina, o índice recuou de 9,3, para 6,7, uma queda de 28%.
Proporção de pessoas com algum grau de pobreza recua de 44,2% para 22,3%
Na POF 2008-2009, cerca de 44,2% da população tinha algum grau de pobreza não monetária multidimensional e 81,7% tinham algum grau de vulnerabilidade. Essas proporções recuaram bastante na POF 2017-2018, quando cerca de 22,3% da população do tinham algum grau de pobreza e 63,8%, algum grau de vulnerabilidade.
Em números absolutos, o contingente de pessoas com algum grau de pobreza não monetária multidimensional recuou de 84,1 milhões para 46,2 milhões, no período analisado.
Nos três índices, há equilíbrio no peso das dimensões, com queda na contribuição dos Transportes
Os resultados também mostram os impactos de cada uma das dimensões nos três índices. No IPM-NM de 2017-2018, as dimensões Acesso aos serviços financeiros e padrão de vida (19,2%), Educação (17,6%) e Saúde e alimentação (17,0%) apresentaram as maiores contribuições para o total dos efeitos marginais no índice. Transportes e lazer, que liderava na edição anterior, saiu de 21,3% para 15,7% enquanto moradia deu um salto de 9,9% para 14,7%. Por fim, Serviços de utilidade pública manteve o mesmo patamar: de 15,5% para 15,8%.
No IVM-NM, o acesso aos serviços financeiros e padrão de vida subiu de 19% para 19,5%, a maior contribuição. A seguir veio a Educação, variando de 18,8% para 18,6%. A contribuição de Transportes e lazer, que liderava na edição anterior, caiu de 23,8% para 16,8%. Em seguida, vinham Saúde e Alimentação (de 15,3% para 15,1%), Moradia (de 9,2% para 15%) e Serviços de utilidade pública (de 13,9% para 14,9%).
No IPM-CR, em 2017-2018 as três dimensões com as maiores contribuições foram Acesso aos serviços financeiros e padrão de vida (19,3%), Educação (19,1%) Transporte e Lazer (17,3%).
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