Coelba deve pagar indenização de R$ 10 mil por assédio a funcionária; juíza utilizou perspectiva de gênero A Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia (Coelba) foi condenada a indenizar em R$ 10 mil, por dano moral, uma funcionária vítima de assédio e perseguição por parte de superiores hierárquicos. A juíza substituta do TRT5-BA Adriana Manta da Silva, da 24ª Vara do Trabalho de Salvador, utilizou a técnica de julgamento com perspectiva de gênero como fundamento para sua decisão. Ainda foi acolhido pedido para condenar a empresa ao pagamento de horas extras baseado no direito à desconexão, uma vez que a funcionária trabalhava nos finais de semana atendendo ligações e respondendo mensagens através de aplicativos eletrônicos. Da decisão, ainda cabe recurso.
A trabalhadora alegou que em meados de agosto de 2019, já grávida, começou a sofrer assédio e perseguição. Segundo ela, certa vez estava trabalhando fora da sede, em local onde não havia refeitórios ou restaurantes próximos, e por isso utilizou o veículo da empresa para se deslocar e comprar a refeição, tendo comunicado o fato ao seu supervisor. Esse tipo de prática era comum, sem vedação no código de ética da empresa. Quatro dias após o fato, porém, foi surpreendida com a aplicação de uma suspensão de seis dias. Já ao retornar da suspensão viu que todas as suas responsabilidades haviam sido transferidas a um colega, havendo um esvaziamento de suas atividades.
Dano moral
Em sua decisão, a magistrada Adriana Manta da Silva ressaltou que uma testemunha apresentada pela trabalhadora no processo confirmou de maneira clara e convincente a narrativa da funcionária. “A presente situação merece um olhar com perspectiva de gênero. O rigor excessivo com o qual foi tratada a reclamante, gestante à época, cabalmente provado durante a instrução processual, não pode ser admitido”, salientou.
A juíza explicou que o Brasil é signatário da Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (Cedaw), obrigando-se, na forma do art. 7º, a adotar medidas adequadas, legislativas e de outro caráter, com as sanções cabíveis e que proíbam toda discriminação contra a mulher; a estabelecer a proteção jurídica dos direitos da mulher numa base de igualdade com os do homem e eliminar a discriminação contra a mulher.
Na visão da magistrada, o poder Judiciário, enquanto intérprete e aplicador do Direito, tem o poder e dever de pôr fim ao ciclo discriminatório. “Julgar com perspectiva de gênero não é uma opção hermenêutica, mas um comando que decorre tanto da Constituição Federal, que consagra a igualdade material entre homens e mulheres e veda a discriminação, de leis especiais e de tratados internacionais de que o Brasil é parte”.
Ela entendeu também que a situação da funcionária da Coelba deve ser vista conforme os termos do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que busca reconhecer e neutralizar as desigualdades estruturais que permeiam a presença da mulher, gestante, no mercado de trabalho.
Hora extra
Na sentença, a juíza Adriana Manta da Silva frisou que a hiperconectividade do trabalhador passou a ser considerada um diferencial profissional, ocasionando uma espécie de escravidão digital, na qual a atividade online acaba com a separação entre o tempo de vida destinado ao trabalho e o tempo de vida fora dele. No caso trazido aos autos, a empregada trabalhava aos finais de semana atendendo ligações e respondendo mensagens através de aplicativos, obtendo direito ao pagamento de duas horas extras, e seus reflexos, por cada final de semana trabalhado durante todo o vínculo de emprego.
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região