Os consumidores, então, se desesperam. “No último mês tive que cortar muita coisa, os preços dispararam. A gente até consegue administrar o orçamento, mas e quem está desempregado?”, indaga a aposentada Sônia Zilbernstejn, 80 anos, que percorre, mesmo de bengala, a feira livre do Bom Fim em busca de mercadorias baratas.
Mas não está fácil. Nos últimos 30 dias, a embalagem com três dezenas de ovos, por exemplo, subiu de R$ 18,00 para R$ 25,00 – um aumento de quase 40%. Os legumes na banca do feirante Jorge Pires, com mais de 20 anos no mercado, subiram, em média, 100%. Alguns, como informa ele, triplicaram de preço, caso do repolho, que custava R$ 2,50 e pulou para R$ 8,00. Pires diz que nunca viu uma alta tão expressiva nos preços em tão pouco tempo. “O preço vai ter que cair, porque assim é insustentável”, deduz.
A culpa por esse cenário distópico é das altas sem controle nos preços da gasolina, do diesel e do gás natural, fruto da política dolarizada da Petrobras, e das condições climáticas desfavoráveis pelo aquecimento global. Também, contribuiu o aumento do preço da energia elétrica, que impacta toda a cadeia produtiva, preços esses, administrados pelo governo federal.
Menos mal que os consumidores podem optar pelas feiras livres, que têm preços até 30% mais baratos que nos supermercados. Exemplo do tomate longa vida: enquanto nas bancas o produto varia de R$ 5,80 a R$ 6,98, nos supermercados o preço sobe de R$ 9,49 a R$ 13,90. Alguns produtos, entretanto, não podem ser comprados em feiras – é o caso do leite. A inflação do produto chegou a quase 20% neste ano, segundo pesquisa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
Produtos supérfluos
Pior é a vida de quem comercializa produtos não essenciais. O feirante Marcos Jessof, que há 30 anos negocia queijos e embutidos na maioria das feiras livres de Porto Alegre, informa que sua matéria-prima subiu 50% nas últimas semanas. “Foi em menos de um mês. De repente, estava tudo mais caro. E agora nem estão entregando mais porque avisaram que vai subir de novo”, lamenta o comerciante. A explicação, dessa vez, está no preço do diesel: como o produto vem da cidade de Três de Maio, a 470 quilômetros de Porto Alegre, o frete impacta fortemente os custos do feirante. Como se trata de um produto supérfluo, ele não tem como repassar o aumento de forma integral a seus clientes. Jessof aplicou um aumento linear de 20% nas suas mercadorias, mas, ainda assim, o consumo, segundo ele, caiu por volta de 30%. “Mesmo diminuindo o lucro, a venda caiu muito. O jeito agora é reduzir as despesas da banca, diminuir funcionários e cortar as despesas em casa”, avisa. Outra que sofre no bolso, de comerciante e consumidora, é a dona Elisângela Schinoff. Há cinco anos, ela vende pastéis e massas frescas na sua banca, além de suco de laranja e caldo de cana. Um mês atrás, teve de aumentar em 15% o preço do pastel devido à elevação no custo da carne moída, da farinha, do queijo e dos ovos.
“Aqui é tudo na ponta do lápis, uma ginástica para ganhar um pouco que seja, sem diminuir a qualidade do produto. Não posso aumentar muito porque, senão, o consumidor desaparece. Mas também não posso pagar para trabalhar”, argumenta. Ela conta que já cortou gastos domésticos para reduzir o impacto e planeja diminuir a quantidade de feiras, para gastar menos.
No caso do suco de laranja, a situação é mais grave ainda: a caixa da fruta, que custava R$ 25,00 em fevereiro, saltou para R$ 45,00 em março. Dona Elisângela diz que o preço da garrafa de dois litros do produto, muito procurado pelos clientes, está no limite. “Se aumentar mais, eles nem vêm à banca. E se não vêm, como é que vou vender as outras mercadorias?”, indaga.
Fonte: Extra Classe