As eleições municipais representam oportunidade única para os partidos do campo popular e democrático demonstrarem aos eleitores compromisso com programas, propostas e soluções para os problemas, bem como com os valores fundamentais da democracia, equidade, justiça, direitos humanos, proteção do meio ambiente e promoção de serviços públicos de qualidade, contrapondo-se às forças atrasadas e antidemocráticas. É o que diz Antonio Augusto de Queiroz, jornalista, analista e consultor político, mestre em Políticas Públicas e Governo da Fundação Getúlio Vargas.
Queiroz destaca que esta é a “ocasião de grande valor para promover o resgate da confiança pública e restabelecer o pacto entre eleitorado e eleitos a partir da noção de “coisa pública” e democracia representativa, buscando legitimidade em cada ação ao longo dos mandatos, não apenas durante o período eleitoral.”
Ele entende que para “alcançar esse propósito, os partidos poderiam elaborar “manifesto”, fundamentado em compromissos com políticas públicas e valores republicanos, exigindo que todos os candidatos e candidatas subscrevessem tais princípios. Esses teriam como base alguns “considerandos” orientadores de espécie de “carta-compromisso”, semelhante à que tive a honra de formular e incluir como anexo à cartilha do DIAP, com o título “Eleições municipais: orientação a eleitores e a candidatas e candidatos”.
Considerações
Como sugestão, propôs os “considerandos a seguir”, porém, como se trata apenas de recomendação, cada partido poderá adequar a carta-compromisso aos seus princípios e prioridades, produzindo algo adequado à sua realidade:
“Considerando que o povo, na condição de eleitor, é o legítimo titular do poder e, ao conferir mandato a alguém para representá-lo, o faz com base na trajetória — política/pessoal/profissional/ética — da candidata ou candidato, respaldado no programa apresentado durante a campanha e na exigência de prestação de contas do seu mandato;
Considerando que o eleitor também espera que a candidata ou candidato, uma vez eleito e no cumprimento do mandato, seja autêntico e republicano no exercício das 3 dimensões da atuação parlamentar, a saber, representante da vontade popular, legislador e fiscalizador dos atos e gastos governamentais;
Considerando que exercer cargos eletivos demanda compreensão das necessidades e carências da sociedade e não apenas das preferências pessoais ou de grupos;
Considerando que a coerência entre discurso e prática é o que legitima o exercício da representação e da governança;
Considerando que o cidadão e os movimentos sociais, cívicos e éticos devem apoiar apenas candidaturas comprometidas com causas e projetos que coincidam com os interesses, aspirações, desejos e reivindicações dos munícipes;
Considerando que a descrença na política, nos detentores de mandatos e nos agentes públicos decorre da ausência de confiança na seriedade, na decência e no compromisso dos representantes para com os representados; e
Considerando, ainda, que a ética e a transparência dos atos públicos devem ser premissas indispensáveis à relação de confiança entre representantes e representados.
Compromissos
As candidatas ou candidatos pelos partidos políticos que subscrevem este Manifesto assumem os seguintes compromissos:
1º – Ética na condução do mandato
- Contratar apenas pessoas qualificadas e comprometidas com os princípios deste Manifesto para os gabinetes de apoio aos mandatos;
- Patrocinar ou apoiar exclusivamente pleitos e proposições que sejam ética e moralmente defensáveis;
- Rejeitar todas as propostas que vão contra o interesse dos munícipes ou que possuam caráter antirrepublicano;
- Recusar chantagens, ameaças ou favores em troca de votos nos legislativos; e
- Não tolerar desvios de conduta.
2º – Transparência e prestação de contas dos mandatos
- Prestar contas do mandato e da atuação parlamentar, divulgando todos os pronunciamentos, votações e iniciativas no âmbito dos legislativos;
- Fomentar a transparência ativa, publicando a agenda institucional dos gabinetes de apoio aos mandatos;
- Informar detalhadamente como são utilizadas as verbas de gabinete e as verbas indenizatórias; e
- Divulgar de forma transparente a destinação das emendas aos orçamentos.
3º – Lealdade ao programa partidário e aos seguintes compromissos
- Apoiar e defender a regulamentação da Constituição Federal, da Constituição Estadual e da Lei Orgânica dos Municípios nos pontos ainda não regulamentados, além de empenhar-se pela sua implementação plena, especialmente no que diz respeito aos direitos e garantias dos cidadãos e aos princípios da ordem social, da tributação e da ordem econômica com impacto nos Municípios;
- Fortalecer e defender as funções do Estado, sobretudo na oferta de serviços públicos de qualidade nas áreas de saúde, educação, segurança, meio ambiente e transporte, ao mesmo tempo em que valoriza a profissionalização do serviço público;
- Apoiar e defender a legislação de proteção social, especialmente aquela com impactos positivos na qualidade de vida da população local;
- Apoiar e defender os investimentos municipais em saneamento básico, habitação popular, desenvolvimento sustentável e atração de investimentos que promovam empregos, renda e inclusão social;
- Defender reforma política que garanta: 5.1) equidade nas disputas eleitorais; 5.2) maior aproximação dos representantes eleitos de seus representados; 5.3) redução dos gastos de campanhas eleitorais; 5.4) combate eficaz à corrupção eleitoral; e 5.5) consistência ideológica e programática aos partidos políticos; e
- Apoiar e defender o aprimoramento do pacto federativo, visando garantir que as competências constitucionais sob responsabilidade dos municípios sejam devidamente financiadas, permitindo que os programas federais sejam elaborados e implementados de acordo com as diversidades e peculiaridades existentes no território nacional, além de adotar estratégias e políticas públicas para a redução das desigualdades regionais.
4º – Compromisso, participação e consulta ao eleitorado
- Mediar e intermediar, de maneira transparente e sem buscar vantagens pessoais, as demandas dos movimentos sociais e das comunidades locais com os agentes públicos e privados;
- Criar e manter canais de participação popular e de diálogo dos poderes públicos om os segmentos organizados da sociedade civil;
- Ouvir a comunidade antes de propor políticas públicas;
- Promover consultas periódicas sobre os temas relevantes da conjuntura nacional, estadual e municipal;
- Apoiar a organização da sociedade civil e sua participação no processo político e nas decisões sobre políticas públicas”.
Com atitudes como essas, os partidos do campo democrático e popular certamente estariam contribuindo para:
1) aprimorar a representação política;
2) resgatar a política como valor fundamental da democracia;
3) destacar as diferenças em relação a partidos e candidata ou candidatos associados a posturas antidemocráticas e antipopulares; e
4) enfatizar propostas e a resolução de problemas em detrimento de julgamentos morais, em oposição aos inconsequentes que buscam mandatos por meio de perseguição e ressentimento.
Queiroz é sócio-diretor das empresas “Consillium Soluções Institucionais e Governamentais” e “Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas”, foi diretor de Documentação do Diap e é membro do Cdess (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável da Presidência da República) – Conselhão. O texto de opinião que ele assina foi publicado originalmente na revista eletrônica Teoria&Debate